17 de dezembro de 2012

21/12/2012

  Há algumas horas fiquei sabendo que o mundo ia acabar. Os rumores eram variados, mas o fato era incontestável. Todo mundo já sabia e talvez eu tenha sido o último. E, pra falar a verdade, eu não ligava muito. Ligava menos ainda para o motivo: meteoros, alienígenas ou Jesus, dá tudo na mesma no fim das contas. 
  Meu apartamento de classe média parecia estranhamente apertado. Decidi sair à rua por algum tempo. Duas coisas me chamaram atenção à primeira vista: Havia congestionamento em todas as ruas (provavelmente tentando sair da cidade) e a multidão que se dirigia às igrejas. Eu ri das duas. Da primeira eu ri pois é irônico que as pessoas passem seus últimos minutos de vida enlatadas dentro de um carro, aonde perdem várias horas de seus dias fúteis. Da segunda... bem, não sei direito, a possibilidade da existência de um deus naquele momento parecia patética. 
  As lojas estavam abandonadas e, obviamente, foram saqueadas. De novo eu esbocei um sorriso ao pensar que a ideia de trabalhar quando se pode aproveitar o último dia de sua vida é ridícula. Entrei em uma dessas lojas de conveniência e peguei uma garrafa do melhor uísque e um cigarro. Eu não fumava, mas por que não começar agora? Eu não iria morrer de câncer mesmo... Bebi e fumei como um rei.
  Quando saía da loja decidi pegar uma barra de chocolate. Não estava com fome, mas estava à mão e ninguém iria se importar. Enquanto Andava pela rua pensei que seria passar meus últimos minutos de vida no lugar que mais gosto. Mais um sorriso. Entrei em um prédio desconhecido. Os apartamentos estavam todos abandonados, com as portas abertas... A futilidade consumista parecia ridícula naquela altura. TVs, videogames, computadores... tudo abandonado. Entrei em um dos prédios, a sensação nervosa de que eu estava roubando aflorou em minha mente. Não liguei. Achei o que procurava: peguei uma caneta e uma folha de papel e sentei na sacada. 
  Dizem que quando há a eminência da morte, as pessoas se lembram de quem amam. Dessa vez ri largamente. Não pensei em ninguém. Talvez eu não amasse ninguém... mas, e daí? O caos lá fora diminuíra... o desespero dera lugar às orações. Orações desesperadas. Mas pelo menos entorpeciam as pessoas. A morte doeria menos para elas. 
  Comecei a rabiscar algumas palavras... logo uma estrofe de uma poesia apareceu, em traços seguros. Achei cômico escrever aquilo, já que ninguém leria. Inclinei a cabeça para continuar escrevendo. Ouvi um barulho vindo da sala. Era um cachorro. Estava deitado no canto, provavelmente sentindo que algo estava errado. Mas ele não estava desesperado, nem ao menos latia. Ao meu chamado se levantou e deitou-se no meu colo. Acariciei sua cabeça e pensei que não havia melhor companhia para a morte. 
  Tentei escrever. Outro barulho. Vinha da porta de entrada dessa vez. Uma mulher magra, com cabelos lisos, não muito feia entrou. Voltei os olhos para o papel em minha mão, que era mais interessante. Ela gritou comigo. Algo sobre querer ser comida antes de morrer. Não liguei. Não ia passar meus últimos minutos de vida comendo alguém que nem conheço. Não sei o por que. Só não estava afim mesmo. Ela então sacou uma arma e deu dois tiros. Matou-me no mesmo instante. Aproximou-se de mim, arrancou o papel de minha mão e leu:

Não importa o quanto tentemos ser bons,
mesmo com a última badalada do sino que prevê a morte, 
temos a incrível capacidade de sermos fúteis e desejarmos
nada mais que estarmos vivos, mesmo sem viver. 
Quando a morte chegar, estarei então preparado e

  Ela chorou por alguns minutos, não pela minha morte, mas porque queria saber o que eu escreveria a seguir. Então um forte estrondo se ouviu no horizonte, o chão tremeu e não se viu mais nada. 
  E eu não vivi para ver o fim do mundo. 

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